quinta-feira, 4 de março de 2010

"PADIM CIÇO" MADE IN CHINA
Nas tradicionais romarias em torno de Padre Cícero, em Juazeiro, Ceará, ninguém vende mais estatuetas do que Jony Wang Kai. Detalhe: elas são importadas diretamente da China

Cícero Romão Batista, mais conhecido por Padre Cícero (1844- 1934), misto de clérigo e coronel que arrastou - e ainda arrasta - milhares de fiéis pelo Nordeste brasileiro, acaba de operar mais um milagre, quase 100 anos após sua morte. Por sua causa, um técnico em eletrônica chinês, radicado em Fortaleza, virou um próspero empresário.
Jony Wang Kai ganha a vida vendendo estatuetas do "Padinho" nas famosas romarias que reúnem todos os anos cerca de 2,5 milhões de fiéis em Juazeiro do Norte, no Ceará, berço religioso de Cícero. O curioso da história toda é que as 160 mil estatuetas vendidas por Wang Kai não são fabricadas aqui e sim na China, importadas em grandes contêineres pelo porto de Pecém, a cerca de 60 quilômetros de Fortaleza. Comparados com os simplórios bonecos comercializados pelos feirantes locais, as estatuetas do empresário chinês são o máximo em tecnologia. Graças a um dispositivo eletrônico, cada engenhoca é capaz de cantarolar o bendito da Mãe das Candeias, sem perder a afinação: "Bendito e louvado seja/ a luz que mais alumeia/ Me valha, meu padrinho Cícero/ E a mãe de Deus das Candeias."
Como poderia levar séculos para ensinar um chinês a cantarolar um bendido com sotaque cearense, Wang Kai registrou a reza durante uma romaria e levou a gravação para a China. A idéia de vender estatuetas com chip ocorreu por acaso, na época em que o comerciante chinês, hoje com 36 anos, preparava o trabalho de conclusão do curso de administração em Fortaleza, cidade onde foi morar com a família, há dez anos, depois de perambular, nessa ordem, por Rio, São Paulo e Belo Horizonte - seus pais, vindos de Taiwan, onde Wang Kai nasceu, sempre ganharam a vida vendendo pratos típicos da China. "O tema do meu curso de conclusão era justamente a romaria em torno de Padre Cícero. No fim, o tema foi vetado pelo professor, mas serviu para que eu conhecesse de perto a festa e tivesse a ideia de lançar as estatuetas", diz Wang Kai, que passou cinco meses em Juazeiro observando as romarias e fazendo pesquisas de mercado. Em uma das visitas à Colina do Horto, onde se encontra a estátua do Padre Cícero, ouviu e gravou um violeiro cantando o bendito das Candeias.
O empresário, que é citado até na biografia Padre Cícero: poder, fé e guerra (Companhia das Letras), lançada no fim do ano passado por Lira Neto, vende cada boneco por R$ 2,70, que são revendidos pelos comerciantes durante as romarias por R$ 4,20. Só nessa primeira investida Wang faturou, portanto, cerca de R$ 450 mil. Como o estoque de 160 mil estatuetas está no fim, ele já promete uma nova leva para 2010. Seu sonho agora é criar condições para que as estatuetas sejam fabricadas dentro do Ceará, com a ajuda dos artesões locais, sem perder, digamos, a "tecnologia chinesa" . Enquanto não consegue, os chineses terão muito trabalho pela frente. Wang Kai está negociando as patentes de outros santos, como Nossa Senhora de Fátima e São José. Vai colocar chip em todos eles. Bendito seja o capitalismo.

R$ 450 mil É quanto Jony Wang faturou vendendo 160 mil estatuetas de Padre Cícero

R$ 2,70 Foi o valor de venda de cada estatueta aos feirantes de Juazeiro do Norte

R$ 30 milhões De romeiros são devotos de Padre Cícero no Brasil

Fonte: ISTO É DINHEIRO, 01 DE MARÇO DE 2010.

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